quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

o dia

Farto, um dia farto de informações. Determinou-se que hoje seria dia de sopa de entulho (aquela que tem de um tudo dentro) e às colheradas, que pingavam antes de chegar à boca o caldo grosso e suculento das emoções ali contidas, o espírito irrequieto foi alimentado.

Tinha fome de fato (e de fatos!), tinha fome sempre, um desejo renitente de compreender, de experimentar, de saber... e como os desejos mais verdadeiros tendem a se realizar, a fome hoje cedeu à dieta pesada das emoções mais dispares e intensas que compuseram a mesa.

Começando já pela metade ela continuava tenaz no seu objetivo de ordenar o mundo, tarefa que vem lhe consumindo desde tempos imemoriáveis, mas que é preciso! É preciso limpar, renovar, organizar, livrar-se do que julga não ser mais necessário. Tal qual uma formiga laboriosa, incansável, move de um lado para o outro caixas, papéis e palavras. Sim, finalmente poderá livrar-se de todas aquelas palavras que sequer lhe pertenciam para acomodar outras, quem sabe, que lhe caiam bem.

Nesse desfolhar infinito que servia à verificação do que poderia ser pertinente ou não, do que poderia ocupar ainda lugar em seu espaço, ela re-descobre – fingindo bem para si mesma um certo espanto – em meio aos escombros de textos amarelados um tempo em que era outra e nem sabia ainda o que queria ser quando crescesse. Pois eis que lá se encontrava um lugar ao qual pertenceu durante um tempo, em um espaço onde cabia (ao que parece) sempre dois.

Diante do calor insuportável que fazia lá fora e da nostalgia sufocante que começava a abate-la cá dentro, achou uma folga de suas arrumações para a merenda e pôs-se a cozinhar. Cozinhou, ato que continha o prazer das brincadeiras de menina com suas panelinhas multicoloridas, cozinhar pressupunha concentração nos sentidos de maneira que os sentimentos podiam descansar um pouco. Alívio!

Comeu, choveu.

Há uma visita feliz que será feita ainda hoje. Enquanto percorre a distância entre o eu e o outro, pensa carinhosamente, “agora quem vai visitar sou eu”! Sorri, se perde, aliás, caminhos foram feitos também para serem perdidos, e encontra por puro capricho um fantasminha camarada.
Susto!

Joga os dados. Caminhe duas casas. Pára um táxi cujo motorista afirma com veemência “minhas pragas pegam!”, chega ao seu destino tensa e aliviada (paradoxo que se retro-alimenta...). Abre-se então o portal da troca e as possibilidades são elevadas à sabe-se lá que potência.

O acolhimento da amizade suaviza e fortalece, prepara tudo para que se deleitem as amigas com o desfile inesgotável de histórias, questões, sentimentos, impressões, desejos, frustrações, poesias, experiências, músicas, filmes, retratos (falados e impressos), gargalhadas, dores, inclusive as de saudades, e outras também. Enfim, uma infinidade de coisas e não-coisas absolutamente imprescindíveis para que o movimento não pare.
A despeito do calor, hoje foi dia de sopa, mas não foi qualquer sopa, foi aquela que tem de um tudo dentro, aquela que alivia a fome e fortalece, que a prepara para a continuação da caminhada!
Elisangela Barbosa

2 comentários:

  1. Sempre que leio esse texto, que me nutre e refestela, tenho vontade de me deixar ficar, barriguinha para cima, digerindo cada bocado de sua beleza, bem lentamente.

    A sopa estava uma delícia, amiga! Comfort food para o coração ;-)

    Bjs,
    Bob

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  2. Sim amiga, essa imagem da barriguinha para cima é de um conforto assim bem contente... bem como o que nos alimenta e aquece mesmo o coração.

    Beijos

    Elis

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