quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A minha releitura do "Pertencer" de que falávamos...

Por Roberta Mendes

Sobre as velhas pegadas, novos caminhos.
O viajante, ao viajar, sente-se em casa.
O movimento é sua cadeira de balanço e
a confluência entre a meta e a conquista,
o tapete sobre o qual descansa seus sapatos.
Voltar é revisitar a origem do caminho, o ponto de partida.
Mais do que isso: convalidar a escolha de partir. Eis que,
regressando, já não há nada atrás de si sobre o que voltar-se.
A vida está à frente e no impulso de seus pés.
Homem e sombra coincidem
no marco zero da rosa dos rumos.
O passo seguinte assume o risco de uma direção,
dá-lhe um sentido:o homem ao passo e o passo ao homem.
E porque tudo lhe pareça tão claro
sobrevêm-lhe imagens de coisas encaixando-se:
sandálias aos pés,
chaves a fechaduras (metáfora de preencher e libertar),
peças de um quebra-cabeça atraindo-se como ímãs,
espelho quebrando-se ao contrário, refazendo-se,
recompondo a integridade do que fragmentado estava.
Aí está: o ser inteiro. Em seu tamanho real, é dizer,
Maior do que muitas coisas, menor do que outras tantas,
mas, sobretudo, à altura de ser a si mesmo e isso ser
sua bravura e sua maior fragilidade.
Pertencer pressupõe a qualidade dos fortes.
Precisar é que não. Precisar é querer para si,
enquanto pertencer é querer ser de outrem e aplicar-se,
enquanto movimento, a uma outra vida.
A mão estendida, ao precisar, suplica.
Ao pertencer, desprende-se, oferece de si a sua palma:
entrega-se. O sentimento de pertencer consuma-se
com esse transbordamento mesmo, e independe
(enquanto realidade) da recepção do outro.
Se sinto-me tua e o digo é por fidelidade à verdade minha,
por retidão de restituir a ti o que te pertence
e de mim transborda. É todo teu. Eu, toda minha.
Já não meço forças com a solidão,
nem pretendo sobre o amor prevalecer.
Minha força se distende. Assim, o que à força
imóvel estava, projeta-se, ganha impulso,
descomprime-se. Fica-me o coração, assim,
em pulsante repouso - vivo e em paz.
Ou antes, sereno e em paz porque pulsante e vivo.

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