quinta-feira, 30 de julho de 2009

A Hora de Voltar


- Por Roberta Mendes

Tão permeável estava meu coração ao título desse filme, quando o vi, como se por dentro também o relógio secreto da felicidade, após completar diversos ciclos sobre seus complexos mecanismos de tempo, tivesse feito ecoar sonoramente o alarme da vida, convocando ao despertar. Emoções sutis, inusitado prazer das pequenas coisas, tudo acordado em mim, por esse maravilhoso senso de oportunidade que tem a vida, de vez em quando, de fazer coincidir os acontecimentos com a nossa máxima capacidade de fruí-los, milagre de sincronia entre a maturidade do fruto e a da fome, que, nesse estágio, tapreciação se torna. Essa maturidade (e não esqueçamos, estar maduros é estar prontos!) que é como uma nudez, um modo de crescer ao contrário, perdendo a casca em direção ao caroço das coisas, despojando-se.

Despojando-se de suas experiências tristes, dos temores adquiridos, do ceticismo cuidadosamente cultivado e outros tantos mecanismos de defesa. Assim era o instante de graça em que assisti ao filme, como uma volta, ainda que pontual, ao estado de pureza. Não digo à infância, que infância seria não ter ainda vivenciado coisa alguma. Dá-se que, por vezes, da bagagem emocional abole-se todo o peso e, assim, libertos de gravidade, jogamo-nos à vida alta e profundamente.


No entanto, mesmo a magia se rege por um imperativo irrecusável de tempestividade e tem sua hora, momento preciso de acontecer. Para que entendesses o encantamento do filme, o que ele parecia querer dizer de nós, era preciso que soubesses voltar também. Voltar ao dia em que nos conhecemos e ao modo maciço de sentir daquele dia. Era preciso que te batesse no peito o mesmo, desarmado coração de quem não queria ir embora, sobre o qual descansei o meu sorriso. Então entenderias que a Hora de Voltar era, naquele instante, uma exortação para seguirmos, chamado do desconhecido, passo na escuridão, mãos dadas, salto do anjo em direção à vertigem de sentir.

Mas a hora passou, soterrada pela realidade de ampulheta dos dias que se seguiram. E, agora, já não entenderias...

Ah, tu bem o sabes, encontros são portais, breve intersecção entre nosso mundo e o do outro. Às vezes, instados pelo mistério, transpomos o portal e entramos na outra vida. Ou hesitamos, quer por medo ou por espanto e, súbito, o portal se fecha, transparentemente, como um vidro. Assim, continuamos a nos ver através do vidro, mas já não podemos tocar a substância um do outro, nem nada mais será trocado entre nós, pois que nossos mundos se tornaram reciprocamente impermeáveis.

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